domingo, 31 de julho de 2011

A bola está com os vereadores

Matéria publicada no Diário do Litoral (25/07/2011) por Carlos Ratton



O que era para ser uma investigação exclusiva do Ministério (MP) passou a ser compartilhada. Agora, a Câmara de Vereadores de Guarujá resolveu entrar no jogo e, assim que voltar do recesso (interrupção temporária das atividades legislativas), em 2 de agosto próximo, adotará procedimento especial para apurar o já conhecido Esquema dos Precatórios.



A apuração ficará a cargo da Comissão de Fiscalização e Controle da Câmara, composta pelos vereadores Antonio Addis Filho (PV-presidente); Arnaldo do Nascimento (PDT); Gilberto Benzi (PDT); Marinaldo Nenke Simões (DEM) e Ronald Luiz Nicolacci Fincatti (PDT).



Segundo os vereadores, não está descartada a possibilidade da abertura de uma Comissão Especial de Inquérito (CEI) ou de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI). “Não sei o que pode ser feito, mas a comissão tem, por obrigação legal, investigar tudo”, afirmou Arnaldo Nascimento.



Nascimento não revelou o que ocorre caso a Câmara resolva se omitir com relação ao caso mas, segundo levantado, ao se negar a apurar o vereador pode ser enquadrado no crime de prevaricação - praticado por funcionário público contra a Administração Pública, que consiste em retardar ou deixar de praticar devidamente ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal.



O vereador Ronald Nicolacci, que está se recuperando de uma cirurgia na coluna, fez questão de enfatizar que, assim que o recesso acabar, irá se reunir com os demais membros da comissão. “Precisamos estudar cuidadosamente o caso para tomarmos uma decisão. Uma CPI? Não sei. Talvez, a alternativa mais viável seria acompanhar de perto o trabalho do Ministério Público, solicitando que o órgão nos encaminhe os relatórios sugeridos à Prefeitura”, revelou.



O vereador Gilberto Benzi vai mais fundo. Ele quer que a Câmara convoque todos os procuradores envolvidos no esquema. “ A situação é cabeluda. Assim que voltarmos do recesso, vou me reunir com a comissão e pedir uma oitiva (espécie de coleta de depoimento) com todos os procuradores envolvidos. Enfim, todo mundo”.



Se isso ocorrer, além do procurador denunciante e dos procuradores denunciados, poderão ser convocados funcionários da Secretaria de Assuntos Jurídicos da Prefeitura, a ex-secretária Fábia Margarido Alencar Daléssio e até a prefeita Maria Antonieta de Brito.



O vereador Marinaldo Nenke não foi encontrado, assim como o presidente da Comissão de Fiscalização e Controle da Câmara de Guarujá, vereador Antonio Addis Filho. Porém, segundo apurado, Addis tinha conhecimento o Esquema dos Precatórios e, inclusive, já havia solicitado informações à prefeita Maria Antonieta de Brito.



O Esquema



O Ministério Público (MP) de Guarujá instaurou inquérito civil (24/11-PP) para apurar denúncia daquele que pode ser considerado um dos maiores crimes contra o patrimônio público da Cidade, principalmente porque não há como calcular o tempo em que ele vem sendo praticado, qual o valor total dos recursos desviados e quantas pessoas estariam envolvidas.



Ao que tudo indica, esse é o primeiro caso desvendado. Porém, Segundo apurado e publicado com exclusividade pelo Diário do Litoral (DL), no último dia 11, pelo menos quatro dos cerca de 20 procuradores da Prefeitura, dois funcionários, lotados na Secretaria Municipal de Assuntos Jurídicos, e um advogado conhecido na Cidade estariam no esquema já conhecido popularmente como o Esquema de Precatórios de Guarujá.



O inquérito - que apura improbidade administrativa e prejuízo ao erário - está sob os cuidados do sexto promotor público do Município, André Luiz dos Santos, que já está pedindo providências à Administração Municipal.



A denúncia foi feita por outro procurador da Prefeitura que, segundo consta nos autos, estaria sendo vítima de uma armação, que culminou com uma acusação de crime assédio sexual, na tentativa de desencorajá-lo a denunciar o esquema, que já teria sido responsável, pelo menos nesta denúncia, por desviar milhões dos cofres públicos.



Em fevereiro de 2010, o autor das denúncias foi designado pela então secretária de Assuntos Jurídicos da Prefeitura, Fábia Margarido, para chefiar a Divisão de Contas Municipais (Setor de Precatórios). Fábia Daléssio, segundo o procurador, desconfiava de problemas no setor.



Até que as denúncias sejam totalmente apuradas, o promotor André dos Santos resolveu não conceder entrevista ao DL que, pelo mesmo motivo e apesar de possuir cópias dos autos, optou por não publicar, num primeiro momento, os nomes dos procuradores envolvidos para não atrapalhar os levantamentos que ainda serão realizados pelo MP.



As denúncias indicam desaparecimento de processos públicos, fraudes de certidões imobiliárias e prestação de serviços de advocacia por parte de procuradores da Prefeitura para terceiros, contra a própria Administração Municipal, em processos de precatórios públicos.



Até a perda de prazos propositadamente foi denunciada.

Parece muito, mas as denúncias envolvem ainda acordos judiciais no Tribunal de Justiça (TJ) sem o conhecimento dos setores de Precatórios e Contadoria da Prefeitura, causando danos irreparáveis aos cofres municipais.



Se o esquema for comprovado, o promotor André dos Santos poderá, além de pedir a devolução do dinheiro, denunciar os acusados pelo crime de tergiversação – praticado por advogado ou procurador que defende na mesma causa partes contrárias – que prevê pena de seis a três anos de detenção.



Já o conhecido advogado e as pessoas beneficiadas podem responder por corrupção ativa – oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para induzir a praticar, omitir ou retardar ato de ofício.



A investigação



A investigação promovida pelo DL durou 15 dias. Durante este período, a reportagem ouviu várias pessoas – que não quiseram se identificar - e versões sobre o caso até chegar no autor das denúncias que apesar de, num primeiro momento, concordar em encaminhar os documentos e dar entrevista, estranhamente optou pelo silêncio.



No último dia 5, o DL descobriu que o autor havia sofrido um enfarto, talvez pela pressão dos fatos, mas já estaria recuperado. No dia seguinte(6), soube pelo presidente da OAB, Frederico Gracia, que o MP solicitou o arquivamento das denúncias de assédio sexual que pesavam sobre ele por falta de provas. O suposto assédio teria sido orquestrado pelos procuradores acusados por ele.



MP recomenda ação da Prefeitura



O promotor público André Luiz dos Santos encaminhou recomendação à prefeita Maria Antonieta de Brito. Ele sugere “uma verdadeira auditoria no Departamento Jurídico da Prefeitura, com a revisão de processos em que os cofres públicos podem ter sido lesados”.



A auditoria deve ocorrer até setembro próximo e o promotor solicita que a Administração encaminhe, mensalmente, relatórios ao MP de tudo que já foi descoberto.



Prefeitura se mexe



A Prefeitura de Guarujá informa que, assim que foram formalizadas as denúncias do procurador, a Advocacia Geral do Município abriu sindicância interna para apurar os fatos.



Segundo o setor jurídico da Prefeitura, as denúncias estão sendo apuradas em processo disciplinar interno, razão pela qual não há necessidade de se contratar auditoria externa, como já foi devidamente explicado em resposta encaminhada ao Ministério Público.



Enquanto as denúncias estão sendo apuradas, em nome do princípio da ampla defesa e do contraditório, os servidores permanecerão exercendo suas funções. A Administração Municipal informa que respondeu ao vereador o requerimento de solicitação de informações sobre este mesmo tema.