domingo, 31 de julho de 2011

Isso pode!? - Propaganda eleitoral disfarçada de pessoal domina Guarujá

Matéria publicada no Diário do Litoral (06/06/2011) - Por Carlos Ratton

Apesar da manifestação pública de um cidadão - estando ele no exercício de um mandato ou seja ele um interessado em se candidatar - não possa ser tipificada, de imediato, como propaganda eleitoral antecipada e ser punida como tal, em Guarujá, existem dezenas de pré-candidatos usando esse expediente para colocar seus nomes para uma suposta apreciação do eleitorado.

Disfarçada de promoção pessoal, a propaganda eleitoral – o que só é permitida após 6 de julho de 2012 (ano em que teremos novas eleições) - “corre solta” , como se diz na giria popular, na Pérola do Atlântico, por intermédio, principalmente, de adesivos nos veiculos particulares.

A ânsia de utilizar propaganda eleitoral camuflada de pessoal, porém, resulta alguns exageros, como frases de efeito e datas sugestivas às eleições, como: Nenê 2012 – ele vem aí!; Rubinho – eu acredito!; Celso – transporte essa idéia; Machado, neles!; Miltinho – amizade tem nome; e outros.

Um deles utiliza até os já famosos adesivos da Família Feliz, aqueles colocados na lataria do carro formado por bonecos palito, acompanhado do nome dando a entender que o canditato tem perfil familiar. Porém, estrategicamente, nenhum, coloca o cargo que pretende exercer, caso seja escolhido pelo eleitorado guarujaense.

Percebendo que os novatos podem deixá-los para trás na corrida eleitoral, até vereadores já aderiram à medida, com objetivo de se reeleger. O resultado é uma cidade completamente tomada pelo espírito eleitoral, um ano antes de inicio oficial do pleito.

Segundo entidades especializadas em legislação eleitoral, é importante que fique claro que exemplos de promoção pessoal são mensagens de natal, fim de ano, páscoa, dia das mães, faixas de congratulações pelo dia internacional da mulher, felicitações pelas datas comemorativas do município e outros.

O que, naturalmente, não vem ocorrendo em Guarujá, onde os supostos candidatos solicitam que cabos eleitorais providenciem faixas de agradecimento por algum ato supostamente louvável, além de adesivar o nome nos veículos, numa tentativa frenética de se tornarem mais conhecidos do público.

E não é preciso ser especialista em marketing para perceber que já existe uma campanha eleitoral nas ruas. No município, quanto mais dinheiro tem o “candidato”, mais adesivos podem ser observados nos carros, numa demonstração clara, segundo estudiosos na área, de abuso de poder econômico.

Para o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), existem três condições simultâneas que determinam a propaganda eleitoral: a induvidosa intenção de revelar ao eleitorado o cargo político que se almeja; a ação que pretende o beneficiário desenvolver; e os méritos que o habilitam ao exercício da função; além da veiculação a partir de 6 de julho do ano da eleição.

Propaganda implícita
O cientista político santista Fernando Chagas não tem dúvida: “é propaganda eleitoral implícita e influencia antecipadamente o eleitor. Mas não existe, pelo menos juridicamente, como caracterizar a infração, porque os candidados se beneficiam de uma brecha na legislação eleitoral”, comenta.
Fernando Chagas alerta que existe uma lacuna entre a realidade e o texto legal que não possibilita, entre outras coisas, uma ação efetiva da Justiça Eleitoral.

Para o cientista, a iniciativa favorece os candidatos com mais dinheiro, promovendo grande desigualdade competitiva. “Quem tem mais dinheiro sai na frente e os menos favorecidos economicamente perdem espaço. É uma estratégia de marketing que devem aumentar próximo das eleições”, finaliza Chagas.

Caso a caso
O advogado Alexandre Shammass Neto afirma que a situação em Guarujá precisa ser analisada caso a caso pela Justiça Eleitoral. “Mas, para isso, é preciso que ela seja provocada. Ou seja, que um cidadão que se sinta incomodado faça uma denúncia”, revela.

Shammass explica, ainda, que independente do cidadão denunciar, pode acontecer do Ministério Público tomar essa iniciativa, como forma de coibir os possíveis abusos sob o manto da promoção pessoal.

Dinheiro jogado fora
Já para o publicitário Renê de Moura, que possui empresa especializada em marketing, esse tipo de iniciativa favorece apenas os políticos mais conhecidos. “Se o cara não tiver base eleitoral e peso político, ele está jogando dinheiro fora. Ou seja, o resultado será pequeno”, afirma.

Embora ainda seja cedo para iniciar um trabalho deste tipo, o publicitário defende, no tempo certo e dentro da legislação eleitoral, ações mais efetivas, elaboradas com planejamento e por profissionais. Para ele, o adesivo em veículos é apenas uma peça numa grande engrenagem de marketing, que só dá certo para quem tem tempo de estrada.

E o poderá acontecer com o ex-prefeito Waldir Tamburus. Alguns carros que circulam, principalmente pelo centro da Cidade, têm colada em seus vidros traseiros a seguinte frase: “Waldir Tamburus vai voltar... para resgatar o nosso melhor”.

E foi justamente da boca de um eleitor dele é que veio a confirmação que existe uma campanha eleitoral em pleno vigor em Guarujá. Abordado pela reportagem, o homem, que possuia um adesivo do ex-prefeito no carro, foi logo dizendo: “você vai votar nele?”

Além da propaganda estampada nos veículos que circulam pela cidade, muitos supostos candidatos podem ser vistos nos principais cafés e pontos de encontros políticos de Guarujá com verdadeiros pelotões de cabos eleitorais e simpatizantes. Há, inclusive, informações de reuniões sistemáticas para definir estratégias de campanha.

Na mira do MP

Procurado pela reportagem, o promotor público de Guarujá André Luiz dos Santos disse que o Ministério Público já está atento à situação, mas não recebeu denuncia alguma com relação à propaganda eleitoral antecipada.

Segundo o promotor, os supostos candidatos podem estar se aproveitando de uma falha na legislação para antecipar a campanha. “Inclusive, a jurisprudência tem exigido, para a classificação da prática como propaganda eleitoral antecipada (que é vedada por lei), algo mais que a simples divulgação do nome. Segundo o atual entendimento do TSE, para o enquadramento destes atos como propaganda antecipada, é fundamenal que exista também um apelo pelo voto”.

Santos afirma que a prática pode, sim, caracterizar abuso de poder econômico e desigualdade. “ A dificuldade, no caso, é reunir provas acerca deste abuso a ponto de se conseguir cassar o registro (na ação de investigação judicial eleitoral) ou anular a votação e interromper o mandato (no recurso contra a expedição do diploma ou na ação de impugnação de mandato eletivo)”, comenta.

O promotor André Santos finaliza enfatizando que, em tese, o Ministério Público Eleitoral não tem nenhuma providência a tomar agora. Somente após os pedidos dos registros das candidaturas é que a legislação eleitoral poderá ser aplicada.

“O que podemos dizer é que estamos atentos e colhendo elementos que, no futuro, possibilitarão uma atuação tendente a evitar que o pleito seja maculado pela quebra da necessária igualdade de forças. Mas esta é a função primordial do MP eleitoral: garantir que a vontade do povo prevaleça, tutelando, inclusive, que esta não seja viciada por práticas ilegais”, conclui.